STF altera entendimento trabalhista quanto à cobrança de honorários periciais e sucumbenciais
Na última quarta-feira (20/10/2021) o Supremo Tribunal Federal finalizou o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalide nº 5766, declarando, por maioria de votos, serem inconstitucionais os artigos 791-A, §4º e 790-B, ambos da CLT, alterando a legislação laboral quanto à possibilidade cobrança de honorários advocatícios e periciais ao beneficiário da justiça gratuita, ou seja, aquele que tem salário igual ou inferior à 40% do teto de benefícios do INSS (atualmente no valor de R$ 6.433,57).
De acordo com os referidos artigos, o beneficiário da justiça gratuita, se sucumbente no pedido que determinou a realização de perícia, deveria realizar o pagamento dos honorários periciais (art. 790-B). O parágrafo 4º do art. 790-B dispunha que o proveito econômico percebido na demanda ou em outro processo pelo beneficiário da justiça gratuita vencido na perícia responderia pelos honorários periciais.
Noutro giro, o parágrafo 4º do artigo 791- A dispunha que na hipótese do benefíciário da justiça ser vencido e não ter obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar os honorários sucumbenciais devidos ao patrono da parte contrária, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficariam sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderiam ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrasse que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.
Com o recente entendimento do Supremo, a possibilidade de cobrança de tais valores deixa de ser exigida aos benefíciários da justiça gratuita, ainda que estes recebam valores no processo ou que possuam créditos a receber em outros processos.
Lembramos que a possibilidade de recebimento de honorários advocatícios foi inserida pela Reforma Trabalhista (Lei 13. 467/17), fato que à época foi objeto de elogios, uma vez que esperava-se, com esta medida, que o número de "processos aventureiros" diminuíssem na Justiça do Trabalho, conforme ressaltou o relator da Adin, Ministro Luis Roberto Barroso.
Nunes Marques ao acompanhar o voto do Relator, fundamentou que os princípios sociais não podem servir de escudo para proteger os trabalhadores das consequências da "litigância frívola". No mesmo sentido acompanharam os Ministros Luiz Fux, Gilmar Mendes.
Os demais Ministros votaram no sentido da inconstitucionalidade, porém com algumas divergências entre seus votos.
Para os Ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber, a inconstitucionalidade deveria ser integral vez que fere o acesso acesso gratuito à justiça previsto no artigo 5º, inciso LXXIV da Constituição Federal.
Por fim, neste mesmo julgamento, restou decidido que as custas processuais poderão ser cobradas ao beneficiário da justiça gratuita no caso de não comparecimento à audiência sem justificativa, mantendo assim, a constitucionalidade do art. 844 da CLT.
Na prática, a aplicação dos artigos em comento já era mitigada pelo judiciário trabalhista, não sendo uníssona sua aplicação. A título de exemplo, enquanto a 3ª e 8ª Turma do TST haviam firmado entendimento de que a cobrança de honorários do beneficiário da Justiça Gratuita era válida, a 6ª Turma do TST reconheceu a inconstitucionalidade do dispositivo em 2019 (Arg.Inc 10378-28.2018.5.03.0114), e a 7ª Turma do TST firmou entendimento de que a execução de honorários sucumbenciais contra o beneficiário da justiça gratuita só seria possível no caso de prova indiscutível e substancial de alteração economica do demandado, não bastanto o proveito econômico nos autos (AIRR 568-32.2018.5.13.0023). (1)
Entendemos que a fixação deste entendimento pelo Supremo uniformizará as próximas decisões quanto a esta temática, no entanto, tendo em vista que os Ministros não se manifestaram quanto à modulação dos efeitos da decisão, o tema poderá gerar grande insegurança jurídica quanto aos casos pretéritos perinente aos honorários percebidos daqueles beneficiários da justiça gratuita.
Há uma corrente doutrinária indicando a possibilidade de requerimento para que tais verbas adimplidas pelos beneficiários em momento anterior ao julgamento, por se tratar de lei inconstitucional desde a sua criação.
Com a publicação do julgamento, ainda existe a possibilidade de requerimento da modulação via embargos de declaração (2), de modo que acompanharemos o caso com proximidade para indicação de qualquer alteração.
Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedente o pedido formulado na ação direta, para declarar inconstitucionais os arts. 790-B, caput e § 4º, e 791-A, § 4º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), vencidos, em parte, os Ministros Roberto Barroso (Relator), Luiz Fux (Presidente), Nunes Marques e Gilmar Mendes. Por maioria, julgou improcedente a ação no tocante ao art. 844, § 2º, da CLT, declarando-o constitucional, vencidos os Ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Redigirá o acórdão o Ministro Alexandre de Moraes. Plenário, 20.10.2021 (Sessão realizada por videoconferência – Resolução 672/2020/STF).
Equipe Trabalhista do CM Advogados
NOTAS
(1) https://www.conjur.com.br/2020-nov-15/nayara-marques-tst-honorarios-sucumbencia
(2) https://www.jota.info/stf/do-supremo/stf-afasta-artigos-da-reforma-trabalhista-que-alteram-acesso-a-justica-gratuita-20102021