O Ministério da Fazenda, por meio da Portaria Normativa MF nº 1383, de 29 de agosto de 2024, instituiu o Programa de Transação Integral (PTI). Essa iniciativa visa proporcionar maior eficiência na resolução de litígios fiscais por meio de acordos consensuais entre contribuintes e a União.

A criação do Programa de Transação Integral (PTI) marca uma nova abordagem na gestão do contencioso tributário de alto impacto econômico no Brasil. Este programa foi concebido com o objetivo de implementar medidas que visam à redução significativa do contencioso, promovendo a regularização de passivos tributários e facilitando o encerramento de litígios que oneram tanto os contribuintes quanto a administração pública.

A avaliação dos casos que podem ser incluídos no PTI é conduzida pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que é a entidade responsável por mensurar o Potencial Razoável de Recuperação do Crédito Judicializado (PRJ). Esse processo de mensuração leva em conta fatores como o grau de indeterminação dos resultados judiciais e a temporalidade das discussões judiciais envolvidas, garantindo que as transações sejam realizadas com base em critérios sólidos e previsíveis.

Uma característica fundamental do PTI é a colaboração interinstitucional entre a PGFN e a Receita Federal do Brasil (RFB). Ambas as instituições trabalham em conjunto na identificação e verificação dos créditos elegíveis, além de compartilhar informações cruciais para a mensuração da capacidade de pagamento dos contribuintes. Este esforço conjunto assegura que as decisões tomadas no âmbito do PTI sejam bem fundamentadas e que o processo seja conduzido de forma coordenada e integrada.

 

Modalidades de Transação do PTI

O PTI é estruturado em duas modalidades distintas: a transação na cobrança de créditos judicializados de alto impacto econômico e a transação no contencioso tributário de relevante e disseminada controvérsia jurídica, também de alto impacto econômico.

Na modalidade de Transação na Cobrança de Créditos Judicializados de Alto Impacto Econômico, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) mensura o Potencial Razoável de Recuperação do Crédito Judicializado (PRJ), com base no prognóstico das ações judiciais, o grau de indeterminação dos resultados e a temporalidade das discussões judiciais. O objetivo é recuperar créditos inscritos em dívida ativa da União, utilizando critérios objetivos para avaliar a viabilidade econômica da transação.

Por sua vez, a modalidade de Transação no Contencioso Tributário de Relevante e Disseminada Controvérsia Jurídica, é voltada para controvérsias que envolvem questões jurídicas amplamente debatidas e de significativo impacto econômico, e 17 temas estão entre os contemplados no Anexo I da portaria. Os temas abrangem as seguintes questões:

  1. Discussões sobre a incidência de contribuições previdenciárias sobre valores pagos a título de participação nos lucros e resultados da empresa;
  2. Discussões sobre a correta classificação fiscal dos insumos produzidos na Zona Franca de Manaus e utilizados para produção de bebidas não alcoólicas, para fins de aproveitamento de créditos de IPI e para fins de definição da alíquota de PIS/COFINS e reflexo no IRPJ e na CSLL;
  3. Discussões sobre a irretroatividade do conceito de praça previsto na Lei nº 14.395, de 8 de julho de 2022, para aplicação do Valor Tributável Mínimo – VTM nas operações entre interdependentes, para fins de incidência do IPI;
  4. Discussões sobre dedução da base de cálculo do PIS/COFINS, pelas instituições arrendadoras, de estornos de depreciação do bem, ao encerramento do contrato de arrendamento mercantil;
  5. Discussões sobre requisitos para cálculo e pagamento de Juros sobre o Capital Próprio (JCP);
  6. Discussões sobre a incidência de IRPJ e CSLL sobre o ganho de capital no processo de
  7. desmutualização da Bovespa; e discussões sobre a incidência de PIS/COFINS na venda de ações recebidas na desmutualização da Bovespa e da BM&F;
  8. Discussões sobre amortização fiscal do ágio;
  9. Discussões sobre a incidência de PIS/COFINS nos casos de segregação da empresa para quebra da cadeia monofásica;
  10. Discussões sobre as Instruções Normativas RFB nº 243/2002 e nº 1.312/2012 na disciplina dos critérios de apuração do preço de transferência pelo método PRL, conforme o art. 18 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996;
  11. Discussões sobre a incidência de contribuição previdenciárias do empregador nas hipóteses de contratação de empregados na forma de pessoa jurídica, com dissimulação do vínculo empregatício (“pejotização” da pessoa física);
  12. Discussões sobre a incidência de IRPF e de contribuição previdenciária sobre os valores auferidos em virtude de planos de opção de compra de ações, chamados “stock options”, ofertados pelas empresas a seus empregados e/ou diretores;
  13. Discussões sobre dedução de multas administrativas e regulatórias da base de cálculo do IRPJ e da CSLL;
  14. Discussões sobre incidência de IRRF sobre ganho de capital auferido por investidor não residente no País (INR);
  15. Discussões sobre dedutibilidade da base de cálculo do IRPJ e da CSLL das despesas com a emissão ou a remuneração de debêntures;
  16. Discussões sobre a incidência de IRRF e CIDE sobre as remessas ao exterior efetuadas por empresas do setor aéreo;
  17. Discussões acerca da aplicação das regras de preços de transferência para fins de apuração do IRPJ e da CSLL com base nos arts. 18 a 24 da Lei nº 9.430, de 1996, relativamente ao setor aéreo; e
  18. Discussões acerca da tributação de receitas na apuração do Lucro Real e da base de cálculo da CSLL das empresas do setor aéreo.

 

Adesão do PTI

Para aderir a qualquer das modalidades de transação, os contribuintes devem apresentar suas propostas através de processos digitais, seja no Portal e-Cac, quando os créditos tributários ainda estão em discussão no contencioso administrativo, ou no Portal Regularize, no caso de créditos já inscritos em dívida ativa da União.

O PTI é aplicável tanto a casos que se encontram na esfera administrativa quanto judicial, e a avaliação das propostas é realizada pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e pela Receita Federal do Brasil (RFB), com base no potencial de recuperação do crédito e na viabilidade econômica da solução proposta.

 

Vantagens do PTI

Entre as vantagens proporcionadas por esta modalidade de transação, destaca-se a celeridade, pois permite a resolução mais rápida de disputas fiscais que, de outra forma, poderiam se arrastar por anos. Além disso, oferece segurança jurídica aos contribuintes, que podem resolver suas pendências com maior previsibilidade, evitando as incertezas que poderiam surgir de decisões judiciais desfavoráveis.

Por fim, a flexibilidade do processo possibilita a negociação de condições que sejam economicamente viáveis para o contribuinte, respeitando as particularidades de cada caso e promovendo um ambiente de maior estabilidade nas relações fiscais

Os contribuintes ainda podem incluir múltiplos créditos na oferta inicial de transação, optando por uma das modalidades previstas, sendo vedada a cumulação de modalidades para um mesmo crédito.

No que se refere aos depósitos vinculados aos débitos a serem quitados através do PTI, a portaria estabelece que esses depósitos serão automaticamente transformados em pagamento definitivo, o que simplifica e agiliza o processo de regularização. A execução do programa é coordenada pela Secretaria-Executiva do Ministério da Fazenda, em parceria com a PGFN e a RFB. Essas entidades são também responsáveis pela elaboração de relatórios públicos periódicos, que documentam o progresso das negociações e os resultados alcançados, assegurando a transparência e a accountability do programa.

 

Benefícios e Desafios

O Programa de Transação Integral oferece uma oportunidade significativa para a regularização de passivos tributários com maior segurança jurídica. Ao permitir acordos que consideram a realidade econômica do contribuinte e o cenário jurídico dos créditos em disputa, o PTI busca encerrar litígios que se arrastam por anos, aliviando tanto o Judiciário quanto a Administração Tributária.

No entanto, a plena efetividade do programa depende da regulamentação complementar a ser editada pela PGFN e pela Receita Federal do Brasil (RFB), que detalhará os procedimentos e prazos para adesão, assim como as condições específicas para a celebração das transações.

A regulamentação complementar que será emitida por esses órgãos é fundamental para definir como as transações previstas no PTI serão efetivamente implementadas. Entre os aspectos que necessitam de maior clareza estão os critérios de elegibilidade, que determinarão quais créditos tributários poderão ser incluídos nas transações. Além disso, os prazos específicos para a submissão das propostas de transação precisam ser estabelecidos, o que permitirá aos contribuintes um planejamento mais adequado para a regularização de suas dívidas fiscais.

Outro ponto crucial que dependerá dessa regulamentação são os limites máximos para os descontos concedidos sobre os valores dos créditos tributários, conforme autorizado pela Lei nº 13.988/2020. Esses limites incluem tanto o teto para abatimentos quanto a aplicação de descontos progressivos, levando em consideração a capacidade de pagamento do contribuinte.

 A regulamentação também deverá detalhar as condições de parcelamento e as formas de pagamento dos créditos, especificando o número máximo de parcelas, os prazos e a possibilidade de utilizar prejuízos fiscais, base de cálculo negativa da CSLL ou precatórios na quitação dos débitos.

A metodologia para a avaliação do Potencial Razoável de Recuperação do Crédito Judicializado (PRJ) também precisará ser claramente definida. A regulamentação deve delimitar como serão considerados fatores como o risco de insucesso das ações judiciais e o tempo de tramitação dos processos, elementos que influenciam diretamente na recuperabilidade dos créditos.

A expectativa é que essa regulamentação complementar traga não apenas transparência nos critérios de avaliação, mas também permita uma margem de flexibilidade nas negociações, de forma que os acordos possam ser ajustados conforme a realidade financeira de cada contribuinte. A segurança jurídica é outro aspecto central; as normas complementares devem assegurar que os acordos firmados no âmbito do PTI sejam respeitados, desde que as condições estabelecidas sejam cumpridas.

 

Conclusão

Em resumo, as condições específicas para a execução das transações previstas no Programa de Transação Integral ainda dependem de atos normativos que a PGFN e a RFB deverão editar. Essas normas são aguardadas com grande expectativa por empresas e especialistas, pois definirão como os contribuintes poderão utilizar o PTI para resolver suas pendências fiscais.

A regulamentação detalhada será essencial para a plena implementação do programa, garantindo que os contribuintes possam usufruir dos benefícios propostos de forma segura e eficiente. Este escritório continuará acompanhando de perto o desenvolvimento dessas regulamentações e está à disposição para orientar seus clientes sobre a melhor forma de aderir ao PTI e regularizar suas situações tributárias.

 

Por Luana Alves de Souza