Por Rachel Letícia Curcio Ximenes

RESUMO: O presente artigo busca analisar a transformação pela qual, inevitavelmente, os cartórios notariais e de registros públicos passaram. Com o advento das novas tecnologias e sua popularização, foram se estreitando as relações pessoais e as transações realizadas pela "internet" foram ganhando cada vez mais força e importância. Nesse sentido, foi preciso observar a importância das serventias extrajudiciais, sua relevância e sua interferência como meio de consolidação de políticas públicas, assegurando aos cidadãos o acesso aos seus direitos fundamentais, principalmente no que tange a cidadania. Por meio dos serviços notariais e de registro são garantidos a todos o pleno exercício ao direito de registro, óbito, casamento, divórcio, dentre outros, essenciais para um bom desenvolver da vida em sociedade. Nesse caminhar, as serventias extrajudiciais necessitaram se adequar a essa nova realidade, de modo a prestar seus serviços remotamente de forma produtiva e eficiente, trazendo conforto, comodidade sem perder toda a segurança jurídica necessária.

I. INTRODUÇÃO
As atividades notariais e de registros estabelecem-se no mundo jurídico como ferramenta de auxílio ao poder judiciário, trazendo à população maior celeridade e eficiência aos atos pretendidos. Muito além desse fato, as serventias extrajudiciais são fundamentais na quebra de barreiras sociais e na concreta aplicação da cidadania.
Durante o ano de 2020 o mundo foi surpreendido com o surgimento da pandemia da COVID-19, que se disseminou de forma incontrolável, atingindo a população mundial tendo sido declarada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como pandemia. Pode se conceituar pandemia como uma doença que atingiu o ápice de contaminação mundial, indicando que a enfermidade se espalhou por diversos continentes com transmissão entre os indivíduos.
Dada a incerteza dos acontecimentos, fez-se necessária a adaptação de todos ao chamado isolamento social, onde a regra é o distanciamento social. Não se lembra a última vez que tal medida foi necessária na sociedade contemporânea. Frente a este fato, foi indispensável uma adaptação à nova realidade, remodelando todos os meios possíveis para atender as recomendações do órgão sanitário.
A implementação de meios eletrônicos foi indispensável para que a sociedade, como um todo, pudesse, de forma remota, realizar e pleitear seus direitos inerentes a condição de cidadão. E é exatamente nesse ponto que as serventias extrajudiciais vêm para assegurar a todos o pleno exercício de seus direitos.

Procurou-se demonstrar de forma sucinta a importância desenvolvida pelos notários e registradores, sua busca por um maior aperfeiçoamento e o quanto o trabalho desenvolvido é de suma indispensabilidade, possibilitando, dessa forma, que os serviços sejam prestados de forma remota, sem perder a credibilidade e a segurança as quais são inerente à atividade.
II. DO INDISPENSÁVEL DESEMPENHO DAS FUNÇÕES NOTARIAIS E DE REGISTROS PÚBLICOS
É fato notório que os cartórios de notas e de registros públicos desenvolvem indispensável função no bom desenvolver social. Dotados de fé pública, os delegatários são selecionados por meio de concurso público de provas e títulos, estando sujeitos às responsabilizações decorrentes de suas funções, tanto na esfera civil, quanto na criminal. Ceneviva (2005) traz que:
É a Fé Pública que afirma a certeza e a verdade dos assentamentos que o notário e o oficial de registro praticam e das certidões que expeça, nessa condição. Ao detentor dessa atribuição cabe-lhe a expressão da verdade, ou melhor, vige a crença popular de ser correto, autêntico em tudo aquilo que dita e escreve, salvo incontestável prova em contrário, já que a sociedade não pode ser traída em nenhuma hipótese.
Dito isto, passemos a entender, um pouco mais suas atribuições. Sem se aprofundar muito no tema, podemos trazer que o registro civil tem como preceito fundamental trazer a justiça social à luz, visto que guarnece os dados básicos necessários para a construção de políticas públicas e, consequentemente, originando e viabilizando o pleno exercício da cidadania.
Cumpre ressaltar a ideia de cidadania. Nesse ponto, é importante se atentar ao fato de que se considera o cidadão por si mesmo, como sua própria unidade, identificando-se uma tutela individual que preceitua a ideia do estado de uma pessoa natural. Neste conceito, traz o Doutrinado Paulo Bonavides (2009):

O conceito contemporâneo de cidadania se estendeu em direção a uma perspectiva na qual cidadão não é apenas aquele que vota, mas aquela pessoa que tem meios para exercer o voto de forma consciente e participativa. Portanto, cidadania é a condição de acesso aos direitos sociais (educação, saúde, segurança, previdência) e econômicos (salário justo, emprego) que permite que o cidadão possa desenvolver todas as suas potencialidades, incluindo a de participar de forma ativa, organizada e consciente, da construção da vida coletiva no Estado democrático.
A cidadania se estabelece como basilar para o Estado brasileiro, conforme expressamente disposto no carta magna, trazendo uma configuração superior ao simplesmente titular de direitos políticos. Em verdade, traz a qualificação e reconhecimento do indivíduo como um ser que compõe a sociedade estatal. Deste modo, Dallari (1998) explica que:
A cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social.
Frisa-se, neste ponto, que em uma república federativa, há a real necessidade de que se mantenha uma sólida base principiológica, que terá como resultado a reafirmação de elementos essenciais à cidadania, tais como o compromisso pela moral e soberania do povo e o interesse geral de seus indivíduos de forma igual. A adversidade em se estabelecer uma diretriz própria e capaz para auxilio no combate à pandemia e o exorbitante número de óbitos demonstram a gravidade estrutural do Estado.
Estabelecendo um valor básico, facilitando a percepção de direitos e deveres que resultam a vida em sociedade, a cidadania se estabelece como um princípio. Com isto, resulta- se, de origem da ordem jurídica, os direitos individuais dos cidadãos, que se traduzem em direitos políticos, sociais, culturais e econômicos. Assegura Jaime Pinsky (2010):

A cidadania é um referencial de conquista da humanidade, através daqueles que sempre lutam por mais direitos, maior liberdade, melhores garantias individuais e coletivas. O conceito de cidadania sempre esteve fortemente atrelado à noção de direitos, especialmente os direitos políticos, que permitem aí indivíduo intervir na direção dos negócios públicos do Estado, participando de modo direito ou indireto na formação do governo e na sua administração, seja ao votar (direto), seja ao concorrer a cargo público (indireto). No entanto, dentro de uma democracia, a própria definição de Direito pressupõe a contrapartida de deveres, uma vez que em uma coletividade os direitos de um indivíduo são garantidos a partir do cumprimento dos deveres dos demais componentes da sociedade.

Especificamente com relação ao Registro Civil das Pessoas Naturais, a justiça comutativa, ou seja, atrelada à cidadania decorre do fato de que esta serventia confere publicidade aos principais aspectos do estado da pessoa natural.
A partir disso, atribui autenticidade e segurança aos atos e fatos que influenciam na vida do cidadão. Vale menção a análise de Luiz Guilherme Loureiro (2016) acerca do registro civil:

Tem como foco a pessoa física ou natural, vale dizer, o indivíduo, o ser humano, tal como ele é levado em consideração pelo direito. Cabem ao registrador civil o registro e a publicidade de fatos e negócios jurídicos inerentes à pessoa física, desde seu nascimento até sua morte, tendo em vista que tais fatos repercutem não apenas na esfera do indivíduo, mas interessam a toda sociedade.

O acesso à cidadania, direito reconhecido e documentado, por meios formais, assente o conseguimento de importantes caracterizas ao cidadão, de forma a criar parte de sua essência. Deste modo, Marshall (1967) tratou que a cidadania não é alguma coisa que nasce acabada, mas é construída pela adição progressiva de novos direitos àqueles já existentes, possíveis a partir do reconhecimento formal do cidadão.
As barreiras existentes para que a cidadania seja de fato efetivada culmina desestruturação de todo o aparelho estatal, de modo que o indivíduo, ao não poder usufruir de seus direitos básicos, acata condutas imorais e, muitas das vezes, ilegais, o que geram crises sociais, colocando em xeque a própria existência do Estado.

É nessa seara que o Estado recebe o indispensável auxílio das serventias extrajudiciais. O registro civil de pessoas naturais, por exemplo, estabelece-se como guardião de óbitos e de publicidade ilimitada, devendo, neste ponto, ser utilizado como mecanismo eficaz na elaboração de diretrizes do Estado para lidar com a crise, tais como o direito à vida e, além disso, serve como procedimento de construção e incorporação de mais direitos aos cidadãos brasileiros.
O tabelionato de notas, por sua vez, também carrega consigo a responsabilidade de efetuar novos direitos e assegurar ao cidadão a efetiva disponibilidade social de romper com barreiras existentes. Sobre a história das serventias de notas, cumpre trazer o que preceitua Lucas Almeida de Lopes Lima:

Pode-se dizer que no Brasil, a atividade notarial e registral surgiu efetivamente a partir do chamado registro do vigário (Lei n o 601/1850 e Dec. 1318/1854), com o que a Igreja Católica passou a obrigar a legitimação da aquisição pela posse, através do registro em livro próprio, passando a diferençar as terras públicas das terras privadas. A aludida transmissão, com o tempo, passou a ser realizada através de contrato e, não raras vezes, necessitava de instrumento público, confeccionado por um tabelião. Finalmente, com a ampliação dos atos registráveis, passaram a se submeter ao Registro Geral (Lei no 1237/1864) todos os direitos reais sobre bens imóveis.

A lei que efetivamente disciplinou a atividade notarial foi a Lei n. 7433 de 1985 que dispõe dos requisitos necessários para a lavratura de testamentos e escrituras públicas. Sendo esta, portanto, um marco para o notariado brasileiro. Posteriormente, a Lei n. 8935 de 1994 trouxe a confirmação do art. 236 da Constituição Federal dispondo sobre os serviços notariais e de registro, a denominada Lei dos Cartórios. Por fim, o Código Civil de 2002 normatizou institutos notarias como a escritura pública e o testamento.

Ainda, o Código de Processo Civil trouxe importantes pontos que colaboraram para a importância da atividade ao mundo jurídico, uma vez que ampliou as atribuições do tabelião, em especial, o que tange a produção de provas, com a inserção da ata notarial. Nesse sentido, traz Paulo Roberto Gaiger (2010):

Ata notarial é o instrumento público pelo qual o tabelião, ou preposto autorizado, a pedido de pessoa interessada, constata fielmente os fatos, as coisas, pessoas ou situações para comprovar a sua existência, ou o seu estado.

Ou seja, o notário transformará a vontade das partes alinhada a escada ponteana, a saber, existente, valida e eficaz. Assim, é o que estabelece Gustavo Ige Martins (2007):

Cada vez mais, a função notarial assume posição fundamental dentro da sociedade, pois esta, no desenvolvimento, cria normas e regras numa espantosa velocidade, mal entrando uma em vigor, para outra, a curto ou médio prazo, vir a revogá-la, tornando, pois, necessária a função de um agente contrabalanceador do Estado para prestar essas informações à Sociedade. Esse dever de informação resulta da relação da prestação jurídica que dispensa a segurança absoluta nas relações sociais, havendo a necessidade de que o mesmo certifique-se que os contratantes entenderam perfeitamente o conteúdo do negócio jurídico realizado, aplicando, dessa forma, a certeza e segurança da fé que lhe foi atribuída, para o exercício da função delegada.

Como tratado pelo artigo 236 da Constituição Federal, a atividade extrajudicial como um todo, inclusive a notarial, é típica e privativa com exclusividade do notário dotado de fé pública decorrente do ato de delegação. Harmônico a isso, a atividade notarial possui um viés difuso, abarca interesses da coletividade de pessoas de forma indeterminada com a satisfação do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Assim, segundo Luciana Rodrigues Antunes (2005):

A atuação do notário visa garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos preventivamente, desobstruindo o Judiciário do acúmulo de processos instaurados no intuito de restabelecer a Ordem Jurídica do país, e atuando como instrumento de pacificação social.

Dessa forma, refere-se aos deveres de natureza ético-profissional sendo eles: imparcialidade, independência, confidencialidade, responsabilidade e competência técnica. A partir disso, fica evidente que o titular da serventia extrajudicial ou seu preposto designado para a prática do ato deve se atentar as disposições legais e normativas para que a situação fática desejada seja corroborada pela publicidade, autenticidade, segurança e eficácia decorrentes de sua fé pública. Assim, para Brandelli (2011):

A complexidade das relações sociais e jurídicas obriga a uma intervenção cada vez mais acentuada do Estado na autonomia da vontade privada, a fim de garantir igualdade jurídica às partes, compensando sua desigualdade material, evitando excessos jurídicos e entrelaçando paritariamente os direitos individuais visando ao bem comum ordenado pelo sistema jurídico.

Posto isto, verificada a situação fática que possa ensejar direitos, que possa ser considerado um fato jurídico que provoque efeitos em atos ou negócios jurídicos, o tabelião, incumbido de sua delegação, estará autorizado a proceder e dar efetividade e publicidade ao mesmo. O tabelião, através da escritura pública, dará validade e eficácia aos direitos inquiridos, por ser titular de fé pública que acarreta segurança jurídica e publicidade ao interesse das partes envolvidas.

III. CORONAVÍRUS – OS IMPACTOS DA PANDEMIA NA EFETIVA IMPLEMENTAÇÃO DO SISTEMA REMOTO NAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAS
Os debates acerca da realização dos atos notariais e de registros pela via remota não são novidade no meio jurídico. Era inviável observar uma sociedade que conseguia realizar transações bancárias, compra e venda de bens móveis e imóveis, dentre outras operações essenciais no dia a dia, mas que não podiam praticar atos das serventias pela via remota. Stringher tratou, em 2003, sobre a transposição dos atos cartorários para o "online", dada a circunstância de criação da assinatura eletrônica. Assim dispôs:

Dentro desse diapasão, da criação da assinatura digital e dos certificados eletrônicos (grifo nosso), os Cartórios Notariais e de Registro do Brasil estão se aparelhando para atender a essa futura demanda de autenticação e registro de documentos públicos e privados, que necessitam de formalização para seu pleno reconhecimento legal, em juízo e fora dele.

Dada essas situações fáticas de desenvolvimento tecnológico, crescia a necessidade latente de as serventias se ajustarem a essa nova realidade, proporcionando à população uma prestação de serviço que fosse igualmente eficiente, mas com a comodidade de ser feita sem a presença física até o cartório.
A longos passos, o Conselho Nacional de Justiça editou, no ano de 2018, o Provimento no 74, que dispunha sobre diversificados padrões mínimos de tecnologia da informação. Embora criticado à época de sua edição, a norma veio no sentido de trazer uma infraestrutura básica às serventias extrajudicias, permitindo, deste modo, que os cartórios pudessem se adequar e começar a atender os desafios de uma sociedade cada vez mais digital.
A respeito do tema, Alison Cleber Francisco (2018) tratou em seu artigo sobre a era digital nas serventias, trazendo que:

A maior aderência a um certo meio tecnológico de comunicação implica em maior utilidade desse meio para aqueles que a ele aderirem, resultando na ampliação da interconectividade, seja na sociedade em geral ou em uma determinada serventia, entre todos que lá exercem funções, o que, desde que bem administrado e direcionado a um fim, gerará um ganho de ordem exponencial no trânsito de dados entre os que daquela rede participam.

Muito embora o tema fosse tratado como indispensável, havia sempre grandes ressalvas na implementação de plataformas eficientes a suprir as necessidades de uma efetiva realização remota dos atos. O próprio CNJ era comedido em suas publicações, de modo a não trazer normas pertinentes para tal.
Enquanto não se tinha uma medida efetiva de transição dos atos à via digital, o mundo foi surpreendido com o aparecimento de um vírus que mudaria para sempre a história da humanidade. Em meio a uma crise sanitária onde o contato presencial era totalmente restrito, as serventias precisaram tomar medidas na busca por efetivar direitos e assegurar aos cidadãos a concretude de sua cidadania, bem como desenvolver alternativas a fim de se evitar a interrupção das atividades essenciais, assegurando a segurança jurídica do país.

Além de todos os problemas decorrentes da crise sanitária, a pandemia ainda impôs à todas as instituições medidas rápidas e eficientes de adaptação. Os serviços extrajudiciais também foram sujeitados as essas mudanças durante o período de Emergência em Saúde Pública. À Corregedoria Nacional de Justiça ficou incumbida o estabelecimento de diretrizes que assegurassem a continuidade de prestação dos serviços de registro e notas, assim como a observância de mecanismos que viessem garantir a preservação da saúde de todos os envolvidos na atividade. Não há o que se duvidar que as serventias extrajudiciais estão firmadas na biografia jurídica dos cidadãos, isto é, as principais circunstancias que harmoniza sua vida à realização de direitos básicos.
O registro civil, por exemplo, exerce indispensável papel na elaboração de políticas públicas efetivas no combate ao COVID-19, observado que o registro de óbito deva ser analisado de forma de ponto de partida e não como final. Importante frisar que os óbitos geralmente são registrados no Livro C, com exceção dos óbitos fetais ou natimortos, onde o registro é feito no Livro C-auxiliar. Logo, é imprescindível que o registro seja realizado de forma exata, caracterização adequada e fácil acesso público dessas informações.
Ainda, os oficiais de Registro Civil das Pessoas Naturais elaboraram uma plataforma a fim de disponibilizar os dados dos óbitos causados pelo COVID-19. Esse portal é público e acessível a qualquer cidadão. Os dados são obtidos por meio dos próprios registros das serventias e trazem de forma clara e objetiva as principais causas dos óbitos, especificando sexo, raça, idade, e os números dos casos suspeitos e confirmados. A plataforma tem como proposito:

Em meio à pandemia de COVID-19, os Cartórios de Registro Civil do Brasil reforçam seu compromisso de transparência com a sociedade e passam a disponibilizar informações vitais sobre as causas de mortes constantes nos registros de óbitos lavrados pelos Cartórios de todo o País. As estatísticas aqui apresentadas se baseiam nas Declarações de Óbito (DO) registradas nos Cartórios do País relacionadas à COVID-19 e causas respiratórias relacionadas em dois grandes grupos: pneumonia e insuficiência respiratória. Nas DOs enviadas pelos Cartórios ao Portal da Transparência, além da COVID-19 declarada na DO como causa suspeita ou confirmada, procurou- se também avaliar apenas os dois grandes grupos subsequentes relacionados à doença por coronavírus, como: pneumonia, insuficiência respiratória. Os agrupamentos de causas acima especificados estão classificados segundo as seguintes variáveis: Data do óbito, por período dia/mês em 2019 e 2020, Faixa etária (idade) do falecido (a), Sexo do falecido (a), Brasil, Estados, Capitais.

Deste modo, pode-se observar que as serventias extrajudiciais vêm atuando de modo a se fazerem eficazes e necessários para a concretude de políticas públicas, uma vez que os dados recolhidos podem trazer auxilio na construção de políticas públicos, de forma a reduzir os problemas decorrentes da pandemia de COVID-19.
Os cartórios de notas também desempenharam função fundamental nesse período. Com a adaptação aos meios tecnológicos, a serventia pôde desempenhar papel primordial para assegurar direitos, respeitando as ordens de distanciamento social. O divórcio consensual em cartórios tiveram um aumento de 18,7% entre maio e julho deste ano, segundo dados do Colégio Notarial do Brasil. Esse fenômeno é consequência da publicação de autorização que permitiu a realização de atos de divórcios, inventários, partilhas, procurações, por meio do e-Notariado.
Ainda, nesse sentido, de acordo com um levantamento realizado pela Associação dos Notários e Registradores do Paraná – ANOREG/PR, a procura por testamentos aumentou 70%. Grande parte dessa procura se deu por idosos, que pretendem garantir seus desejos nas transmissões de bens e direitos. Vê-se o sucesso da plataforma que, desde sua implementação já foi responsável por lavrar mais de 10 mil atos e realizou a emissão de amis de 11,3 mil certificados digitais, de acordo com dados do Colégio Notarial do Brasil. O e-Notarial pode ser conceituado, desse modo, como mais um meio de acesso à justiça.

Deste modo, apesar de todos os esforços de transformações na ordem jurídica atual, ainda existem obstáculos que impedem a efetiva aplicação dos direitos, de forma uníssona. Nesse sentido, as atividades extrajudiciais mostram-se como indispensável à implementação e produção de políticas públicas, protegendo o cidadão e seus direitos fundamentais. A propensão atual é de que o atendimento presencial passe a ser exceção e não mais regra, e que ele só ocorra nos casos em que seja indispensável que o ato registral ou notarial seja realizado em pessoa.
Dada a essencialidade dos serviços à população, os cartórios de notas e de registros começaram sua adaptação à forma tecnológica. Desde o princípio da pandemia, os serviços extrajudiciais passaram a realizar seus atos de modo a distância, por videoconferência, pagamento eletrônico e a recepção de documentos digitais. Nesse sentido, a crise pandêmica, sem qualquer sombras de dúvida, veio a fim de demonstrar a real necessidade do uso de meios digitais na prestação dos serviços notariais e de registros públicos.

IV. DA REGULAMENTAÇÃO DA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS REMOTOS E SUAS IMPLICAÇÕES
Com o fator pandemia assolando o Brasil e o mundo, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) se viu na obrigação de fazer valer a proteção social e começou a editar provimentos regulamentando os serviços prestados pelas serventias extrajudiciais no período de pandemia, de modo que essas atividades não fossem interrompidas durante o período de isolamento social.
O primeiro ato normativo a tratar sobre o tema foi o Provimento 91 do CNJ, editado em 22 de março de 2020. A norma regulamentou a suspensão ou redução do atendimento presencial ao público, assim como a suspensão do funcionamento dos cartórios como meio de prevenir a contaminação e propagação do vírus.

Foram editados provimentos diversos, que foram indispensáveis ao bom funcionamento das serventias em período pandêmico. Em entrevista à publicação Cartórios com você, no ano de 2020, o Ministro Humberto Martins, ao ser indagado acerca da importância dos provimentos editados pelo CNJ durante a atual crise de saúde pública, foi enfático e categórico ao assim dispor:

A importância desses provimentos é assegurar a continuidade dos serviços notariais e de registro, que são essenciais para o exercício da cidadania, para a circulação da propriedade, para obtenção de crédito com garantia real, para a prova do inadimplemento com a chancela da fé pública, entre outros direitos.

Muito embora todos os provimentos editados carreguem consigo grande importância ao setor, o provimento no 100/2020 merece um destaque maior. Isto porque foi o responsável por alcançar uma melhor condição de relação existente entre o cidadão e o delegatario dos tabelionatos de nota. Tendo sido publicado em 26 de maio de 2020, o provimento em questão trouxe de forma expressa a autorização aos tabeliães para a prática de seus atos por meio da internet, evitando-se assim, qualquer indagamento a respeito da segurança jurídica proveniente deste ato.
Já em seu artigo 1o é determinada a abrangência das normas, perfazendo que todos os tabelionatos do país devem seguir as normas dispostas quando da prática dos atos notariais eletrônicos. Traz ainda que o Sistema de Atos Notariais Eletrônicos (e-Notariado) que é utilizado, tem como responsável pela sua gerencia o Colégio Notarial do Brasil (CNB), que dispõe de todos os mecanismos necessários para acesso de toda a população. O e-Notariado vem no sentido de trazer uma maior articulação de aproximação entre os notários, fazendo com que seja maior difundido o compartilhamento de informações e tráfegos de dados, sempre respeitando os limites estabelecidos.
Outro ponto importante trazido foi a disponibilização da Matrícula Notarial Eletrônica – MNE, que se estabelece como se fosse uma chave de acesso, disponibilizada ao indivíduo, para que realize todas as assinaturas e procedimentos necessários dentro da plataforma. Vejamos o que traz o artigo 12 do provimento:

Art. 12. Fica instituída a Matrícula Eletrônica – MNE, que servirá como chave de identificação individualizada, facilitando a unicidade e rastreabilidade da operação realizada.
Dado esse fato, o MNE vem no sentido de conectar os procedimentos e funções empregados nos cartórios de todo país, rastreando essas ações para que não haja fraude, ficando armazenado na memória dos dispositivos para que haja comparação nos casos em que a fé pública indispensável não tenha sido observada.
A partir da publicação do provimento e da criação da Matrícula Notarial Eletrônica- MNE, se estabeleceu um alcance maior por parte da população aos serviços notariais dispostos. Para que de fato aconteça o ato notarial pela via remota, devem-se observar requisitos pré- estabelecidos. É necessário, tal como disposto no artigo 9o, que haja uma videoconferência notarial para que seja captado, de forma clara e inequívoca, o livre consentimento das partes acerca do ato celebrado, tal como sua concordância expressa (art. 9, §3o).
Importante se ater ao fato de que, por ser um sistema online, é necessário que haja reparos quando necessário. Nesse sentido, embora o provimento garanta um acesso 24 horas por dia (art. 13), foi estabelecido que serão realizadas manutenções no sistema em datas e horários em que o sistema é menos acessado pela população em geral, garantindo, deste modo que ninguém seja prejudicado.
Devem ser observadas formalidades indispensáveis para a realização dos atos, dentro do programa e-Notariado, de modo que seus efeitos sejam dotados de validade jurídica e que não seja questionada a boa-fé praticada. Um exemplo claro de formalidade a ser atendida pode ser observada no artigo 18 do provimento, que trata:
Art. 18. A identificação, o reconhecimento e a qualificação das partes, de forma remota, será feita pela apresentação da via original de identidade eletrônica e pelo conjunto de informações a que o tabelião teve acesso, podendo utilizar-se, em especial, do sistema de identificação do e-Notariado, de documentos digitalizados, cartões de assinatura abertos por outros notários, bases biométricas públicas ou próprias, bem como, a seu critério, de outros instrumentos de segurança.

Faz-se necessário e indispensável ressaltar que a fé-pública, assim como nas delegações, é requisito indispensável para a realização dos atos, que vem de modo claro no artigo 29 do ato acima descrito:

Art. 29. Os atos notariais eletrônicos, cuja autenticidade seja conferida pela internet por meio do e-Notariado, constituem instrumentos públicos para todos os efeitos legais e são eficazes para os registros públicos, instituições financeiras, juntas comerciais, Detrans e para a produção de efeitos jurídicos perante a administração pública e entre particulares.

Urge trazer que o provimento não deixa claro, de forma taxativa, quais são os atos que podem ser realizados por meio do e-Notariado. Muito embora não haja um rol, o artigo 26 traz que outros atos eletrônicos poderão ser praticados, sempre observadas as diretrizes de estabelecimento, preservando a fé pública dos atos. Dispõe ele:

Art. 26. Outros atos eletrônicos poderão ser praticados com a utilização do sistema e-Notariado, observando-se as disposições gerais deste provimento.

Estando na plataforma todos os mecanismos necessários para a realização dos atos pela via remota, já há uma grande parte dos estados brasileiros que fazem uso desse procedimento, que marca um novo recomeço aos cartórios do Brasil e sua disponibilidade eletrônica. Nesse sentido, não restam dúvidas que os serviços notarias e de registros parecem de necessidade para serem prestados pela via digital. Isso porque, em um primeiro momento, pode-se servir maior eficiência e comodidade ao usuário, segundo porque as serventias vêm se adaptando, dia após dia, as novas necessidades social; terceiro porque nos tempos atuais, onde o distanciamento ainda é a melhor alternativa, os atos podem ser realizados à distância sem qualquer contato físico, tendo à disposição a mesma segurança jurídica necessária.

V. CONCLUSÃO
O presente artigo procurou trazer de forma sucinta a indispensável importância das atividades desenvolvidas pelos notários e registradores ao cidadão. Os delegatarios das serventias extrajudicias fazem parte da nossa vida cotidiana, estando presentes em momentos cruciais, tais como nascimento, casamento e, porque não citar a morte. Com tantos anos de aperfeiçoamento e trabalho árduo, esbarraram em uma realidade da qual era impossível fugir: a internet. Com o mundo cada vez mais globalizado e conectado, fez-se necessário repensar a forma como os serviços eram prestados, de modo a trazer maior comodidade e agilidade, transferindo-se, deste modo, à via digital.
É mais que evidente que, embora haja controvérsias, as serventias extrajudiciais desempenham funções essenciais a garantia da cidadania. Ainda nesse sentido, pudemos observar o mundo assolado em uma crise econômica e sanitária sem precedentes. E nesse sentido as serventias extrajudiciais mostraram-se essenciais para que, mesmo no período conturbado, os cidadãos pudessem usufruir de seus direitos basilares.
Com isto, as especialidades garantem aos cidadãos o direito pleno do exercício da cidadania, inclusive no que tange o post-mortem, por meio do registro de óbito. Os princípios constitucionais são a base do Estado e a sua não observância acarreta grandes injustiças. Além disso, a lei puramente dita não acompanha os fatos sociais na mesma velocidade que eles acontecem, e, portanto, não pode o Estado negar direitos.
Essa nova forma de atuação perfaz-se como um marco no serviço prestado pelas atividades extrajudiciais, atravessando paradigmas aos quais os cartórios são envoltos para se adaptar a uma nova realidade, visto que a inovação tecnológica estabelece-se como uma realidade necessário. Frente a situação criada pela pandemia, as normas editadas pelo CNJ, e a adaptação aos meios eletrônicos, há, indubitavelmente, uma revolução prática dos atos praticados, trazendo ainda mais usabilidade aos cartórios que se estabelecem como essenciais ao desenvolver social.
Leia o artigo na Revista de Direito Notarial


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