Dentre os percalços advindos da pandemia de COVID-19 um dos mais recorrentes às empresas se dá pelas incertezas quanto aos protocolos a serem seguidos e passíveis de fiscalização pelos Auditores Fiscais do Trabalho, principalmente quanto à elaboração de documentos de saúde e segurança do trabalho, afastamento, testagem de colaboradores e emissão de CAT (Comunicação de Acidente do Trabalho) quando da comprovação de funcionários contaminados.
Neste sentido, no dia 01º de abril de 2021, o Ministério da Economia publicou a nota técnica nº 14127/2021 elucidando em detalhes, não apenas orientações sobre o tema, mas especificando as competências do Ministério para tal elaboração com o objetivo de uniformizar os procedimentos.
O texto indica que a aplicação das medidas para prevenção e controle da transmissão da COVID-19 nos ambientes laborais estão dispostos na Portaria Conjunta SEPRT/MS nº 20/20. Neste contexto, o documento foi elaborado em razão da competência legalmente atribuída ao extinto Ministério do Trabalho, o qual foi absorvido pelo Ministério da Economia conforme Decreto nº9.745/2019, devendo, portanto, ser observado por todas as empresas.
Já quanto à fiscalização do cumprimento de obrigações trabalhistas, a Nota cita o disposto na Convenção 81 da Organização Internacional do Trabalho ratificada pelo Brasil, a qual prevê que cada membro da Organização deverá manter um sistema de inspeção do trabalho encarregado de assegurar a aplicação das disposições legais relativas às condições de trabalho e à proteção dos trabalhadores no exercício de sua profissão.
Nesta linha, a Constituição Federal prevê esta competência às Delegacias Regionais do Trabalho, que, por sua vez, foi complementada pelo Decreto nº 4.552/02 onde se atribuiu a competência administrativa de fiscalização aos Auditores Fiscais do Trabalho para averiguar e analisar os locais de trabalho, determinando medidas preventivas necessárias. Portanto, restou esclarecida a competência tanto para elaboração de medidas quanto para a fiscalização.
Quanto ao Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) é imperioso relembrar no dia 3 de dezembro de 2020 o Ministério Público do Trabalho publicou Nota Técnica nº20/2020 indicando a necessidade de inclusão nesse documento de: a) a implementação de rastreamento de casos, b) o afastamento preventivo dos casos suspeitos, ainda que assintomáticos, c) o estabelecimento um programa de testagem sem custo ao trabalhador, d) a previsão do período de quarentena, e) realização exames de retorno ao trabalho ao final da quarentena; f) alteração da função do trabalhador em grupo de risco, além de aconselhar a abertura de CAT.
No entanto a partir da recente Nota Técnica publicada pelo Ministério da Economia restou evidente que a elaboração da Portaria 20/20 foi pensada conforme as indicadores internacionais de saúde e segurança do trabalho, devendo ser considerada como o principal protocolo a ser seguido pelas empresas, razão pela qual todas as medidas de prevenção, controle e mitigação de riscos de transmissão foram exauridas no referido documento.
Em outras palavras, a Nota Técnica esclareceu que não há obrigação legal que imponha a inclusão das medidas para prevenção da COVID-10 no PCMSO.
Prosseguindo, passou-se a elencar detalhadamente sobre cada protocolo trazido anteriormente pelo Ministério Público do Trabalho, determinado a atuação das empresas da seguinte forma:
1) Quanto à necessidade de exames médicos ocupacionais após o período de quarentena e testagem compulsória:
De acordo com a Nota, os exames médicos ocupacionais exigíveis estão presentes na Norma Regulamentadora nº 7, a qual dispõe que o PCMSO deve incluir a realização obrigatória dos exames médicos: admissional, periódico, de retorno ao trabalho, de mudança de função e demissional.
Noutro giro, quanto à testagem compulsória de trabalhadores para COVID-19, tanto a Organização Mundial de Saúde quanto a Organização Internacional do Trabalho não incluem a testagem de trabalhadores como uma medida a ser tomada pelas organizações, sendo que a OMS apenas orienta incentivar o trabalhador a procurar atendimento médico no caso de sintomas, e a OIT cita como ações necessárias o monitoramento da saúde dos trabalhadores, desenvolvimento de protocolos para casos de contágios suspeito e confirmado e fornecimento de proteção de dados médicos e privados, de acordo com as leis e orientações nacionais. Nesta linha, todas estas medidas já estão presentes na Portaria Conjunta SEPRT nº 20/2020.
Destaca-se que os testes sorológicos ou moleculares para COVID-19 não se enquadram entre os exames médicos complementares que devam ser incluídos no PCMSO por não estarem previstos nos itens dispostos Norma Regulamentadora nº 7. Assim, nos termos da referida Portaria, não existe obrigação de testagem pelas organizações, porém, caso realizada, esta deve seguir as recomendações do Ministério da Saúde quanto aos procedimentos e metodologia.
Importante mencionar ainda que a NR 07 traz a obrigatoriedade de exame de retorno ao trabalho apenas àqueles que se afastaram por mais de 30 dias, portanto, em caso de afastamento por COVID-19 por período menor não há qualquer exigência legal para o referido exame.
2) Quanto ao afastamento de trabalhadores para quarentena ou isolamento relacionados à COVID-19
Aqui vale lembrar que, quanto ao afastamento de trabalhadores para quarentena ou isolamento relacionados à COVID-19, a Nota evidenciou a previsão de quatorze dias estabelecida pela Portaria 20/20 em três ocasiões específicas: a) casos confirmados, b) casos suspeitos ou x) contatantes de casos confirmados.
Desse modo, não cabe a determinação de prazos diferentes do previsto naquele documento legal, seja pela inspeção do trabalho ou por qualquer outro agente público, nas situações relacionadas à COVID-19.
Quanto aos contatantes de casos suspeitos deve haver um monitoramento juntamente com uma busca ativa dentro do estabelecimento, incluindo, nos termos do item 2.7 da Portaria 20/2020: canais de comunicação com os trabalhadores referente ao aparecimento de sinais ou sintomas, podendo se realizadas enquetes por meio físico ou eletrônico, contato telefônico ou canais de atendimento e triagem na entrada do estabelecimento por meio de medição de temperatura corporal, inclusive de terceirizados e, a partir da análise dos dados coletados, reavaliar as medidas de proteção adotadas.
3) Quanto aos deveres dos médicos coordenadores do PCMSO ou responsáveis pelo exame médico de trabalhadores na emissão de CAT
De acordo com a Nota Técnica, todas os deveres atribuídos ao Médico do Trabalho previstos na Norma Regulamentadora nº 7 estão em consonância ao disposto no Código de Ética Médica e definições do Conselho Federal de Medicina.
Nesta linha, a emissão de Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT) deve ser solicitada à organização pelo médico apenas quando este confirmar ou suspeitar que a COVID-19 de um trabalhador está relacionado ao seu trabalho, sendo vedado ao médico do trabalho concluir sobre um fato sem considerar todos os fatores que dele possam resultados, como por exemplo, o estudo do local de trabalho e sua organização, dados epidemiológicos e a literatura científica.
Portanto a simples constatação de suspeita ou contaminação por COVID-19 não se mostra suficiente para a solicitação da abertura de CAT, sendo essencial que o médico do trabalho analise o atendimento da empresa às exigências da Portaria Conjunta SEPRT/MS nº 20/2020. Assim, em caso de descumprimento, a solicitação de emissão de CAT deve constar no prontuário médico sob a responsabilidade do médico do trabalho coordenador do PCMSO.
Ainda, nos termos da Nota Técnica SEI nº 56376/2020 de 11 de dezembro de 2020, a COVID-19 pode ou não ser caracterizada como doença ocupacional, sendo imperiosa a avaliação pericial pelo Serviço Pericial Federal para sua caracterização.
Conclusão
Em síntese, a Nota Técnica elucidou as principais dúvidas sobre os procedimentos a serem realizados pelas empresas, de modo que, por meio desta uniformização, evidenciou-se seu caráter vinculante em detrimento do caráter orientador das Notas publicadas anteriormente pelo Ministério Público do Trabalho.
Portanto, por meio da presente Nota Técnica: não é necessário incluir protocolos relativos à COVID-19 no PCMSO por já estarem dispostos na Portaria Conjunta SEPRT/MS nº 20/2020; não existe determinação de testagem compulsória dos trabalhadores pelas empresas, sendo que o exame de retorno ao trabalho só é obrigatório nos afastamentos a partir de 30 dias; e a solicitação de emissão de CAT pelo médico do trabalho apenas será necessária quando da constatação do desatendimento das exigências das medidas previstas na mencionada Portaria, fato que não obsta a necessidade de comprovação do nexo causal por Perito Médico Federal.
Equipe da área Trabalhista do CM Advogados