Por CM Advogados – Equipe Trabalhista

Desde maio de 2021, a publicação da Lei nº 14.151 tem trazido diversos questionamentos ao empresariado quanto às medidas possíveis para garantir o afastamento das empregadas gestantes do ambiente de trabalho durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus.

De acordo com a legislação, a gestante continuará à disposição do empregador para exercer atividades à distância, seja por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho à distância, ou, caso não seja possível o trabalho remoto, o  afastamento ainda deve ocorrer sem prejuízo da remuneração.
Neste sentido, tendo em vista que a lei não faz qualquer ressalva sobre a possibilidade de retorno ao trabalho após a vacinação, passamos a analisar quais as medidas possíveis a serem aplicadas ao presente caso, a fim de buscar equilibrar o ônus deste afastamento entre o empregador e o Estado.
Em primeiro lugar, ressaltamos que, embora esteja em tramitação o Projeto de Lei nº17/2021, o qual busca converter em Lei a Medida Provisória nº1045, seus institutos não mais podem ser utilizados desde o dia 25 de agosto de 2021, portanto, a suspensão do contrato de trabalho ou redução de salário e jornada com percepção do Benefício Emergencial perderam sua vigência.
O mesmo ocorreu com os institutos trazidos na Medida Provisória nº1046, os quais possibilitavam banco de horas especial, adiantamento de férias, antecipação de feriados e alteração de regime para o teletrabalho por meio de acordo individual. No entanto, não há entraves na legislação para que estes acordos continuem sendo realizados com as gestantes por meio de negociação com os sindicatos da categoria, seja por Acordo ou Convenção Coletiva, sendo assim, tais medidas passíveis de serem aplicadas.
Outrossim, recentes decisões promovidas na Justiça Federal têm garantido o afastamento das gestantes pelo INSS em razão da imposição desta lei, atribuindo ao Estado o ônus de arcar com tal impedimento. A fundamentação do pedido de liminar é pautada pelo art. 394-A da CLT, utilizado por analogia ao presente caso para garantir a saúde e segurança das gestantes no local do trabalho para garantir a antecipação do salário-maternidade.
O artigo dispõe que a empregada que labora em atividades insalubres deverá ser afastada do local de trabalho, sem prejuízo de sua remuneração, enquanto durar a gestação, sendo que, caso a gestante não possa realizar suas atividades em local salubre, a hipótese será considerada gravidez de risco e ensejará a percepção de salário-maternidade.

Art. 394-A, §3º Quando não for possível que a gestante ou a lactante afastada nos termos do caput deste artigo exerça suas atividades em local salubre na empresa, a hipótese será considerada como gravidez de risco e ensejará a percepção de salário-maternidade, nos termos da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, durante todo o período de afastamento. (g.n)

Deste modo, a aplicação por analogia ao presente artigo se dá justamente em razão de que a pandemia de COVID-19 tem sido considerada como fator que gera riscos à gestação, tanto pela legislação quanto pelas Notas Técnicas recentemente publicadas pelo Ministério Público do Trabalho.
A título de exemplo, este entendimento foi utilizado para conceder duas liminares na Justiça Federal de São Paulo, sendo a primeira à uma enfermeira (14ª Vara Cível Federal de São Paulo, Processo n. 5006449-07.2021.4.03.6183) por meio de ação de procedimento comum, e a segunda à uma empregada doméstica (1ª Vara Federal de Jundiaí, Processo nª 5003320-62.2021.4.03.6128) através de Mandado de Segurança. Em ambas situações trazidas nas decisões, a natureza do trabalho prestado impossibilitaria o trabalho remoto e o salário maternidade foi deferido.
Por oportuno, trazemos ainda recente decisão do Tribunal Regional da 4ª Região (Agravo de Instrumento nº 5028306-07.2021.4.04.0000/SC), que deferiu, em segunda instância, a caracterização do salário pago como salário maternidade, viabilizando a exclusão dos aludidos pagamentos realizados às gestantes afastadas por força da Lei nº 14.151/21 da base de cálculo das contribuições previdenciárias patronais destinadas à previdência social e aos terceiros (Sistema S).
Dentre as argumentações utilizadas, além do referido artigo, cita-se que os artigos 196, 201, inciso II e 227 da Constituição Federal estabelecem que é dever do Estado garantir o direito à vida, à maternidade, à gestante e ao nascituro.
Quanto às normas internacionais, o Brasil ratificou, por meio do Decreto nº 10.088/2019, a Convenção nº 103 da Organização Internacional do Trabalho, cujo artigo 4º, parágrafo 8º, determina que "em hipótese alguma, deve o empregador ser tido como pessoalmente responsável pelo custo das prestações devidas às mulheres que ele emprega”.
Assim, foram deferidas as tutelas para afastar as gestantes e possibilitar a compensação dos valores correspondentes ao salário-maternidade para a empregadora pessoa jurídica, e a substituição do salário pelo salário maternidade para a empregada doméstica. Outra tese subsidiária a ser utilizada para o requerimento do benefício pela Previdência Social relaciona-se à incapacidade social conferida à empregada, nos termos do art. 76-A do Decreto 3.048/99. De acordo com tal dispositivo, é facultado à empresa requerer o  auxílio por incapacidade temporária aos seus empregados, o qual corresponde ao antigo auxílio-doença previsto antes da Reforma Previdenciária, conforme segue:

Art. 76-A. É facultado à empresa protocolar requerimento de auxílio por
incapacidade temporária ou documento dele originário de seu empregado
ou de contribuinte individual a ela vinculado ou a seu serviço, na forma
estabelecida pelo INSS.

A tese fundamenta-se no fato de que o INSS deve proteger a vida laboral e a vida social dos trabalhadores. Neste sentido, embora o local de trabalho esteja adequado e a gestante não possua doença propriamente dita, a incapacidade social imposta pela legislação com caráter temporário afeta as condições de trabalho da empresa, razão pela qual a via administrativa pode ser uma opção, a princípio, antes de adentrar à esfera social.
Ressaltamos, contudo, que esta medida deve ser analisada com cautela, uma vez que, enquanto não apreciado o pedido, o salário deve continuar sendo pago mensalmente sob pena de configuração de limbo previdenciário, haja vista que a Lei 14.151/21 é clara ao dispor que o afastamento deve ocorrer sem prejuízo da remuneração.
Destacamos, por fim, que as hipóteses elencadas neste informativo não são capazes de concluir sobre entendimento pacífico na jurisprudência, uma vez que se trata de situação recente e inconclusiva até o presente momento.
Além disso, tramita no Congresso o Projeto de Lei nº2058/21 o qual busca solucionar o imbróglio, para que o ônus não recaia integralmente no empregador, bem como que  as gestantes vacinadas não precisem mais manter o afastamento de suas atividades na empresa, todavia, ele ainda está em tramitação perante a Câmara dos Deputados. Assim, manteremos a  constante atualização para delimitação dos procedimentos adequados.