As simplificações trazidas pela LC 182/2021 (marco legal das startups) no âmbito das sociedades anônimas
Por Ana Beatriz Sanches Passos e Bruno Roberto Zambon
Diante da inegável modernização dos modelos de negócios, especialmente as emergentes startups, fora sancionada a Lei Complementar nº 182/2021, com diretrizes pautadas justamente no reconhecimento do empreendedorismo inovador como vetor de desenvolvimento econômico, social e ambiental, incentivo à constituição de ambientes favoráveis dentro do empreendedorismo, dentre outras no mesmo contexto do livre mercado.
A Lei Complementar 182/2021 (Marco Legal das Startups) entrou em vigor no dia 01/09/2021, conforme previsto em seu art. 19, e merece atenção quanto às alterações trazidas para a Lei nº 6.404/76 – Lei das Sociedades Anônimas, listadas no art. 16 da LC em comento.
As alterações a seguir discutidas representam verdadeira modernização e desburocratização das sociedades anônimas e por isso, apesar de não expressamente assim denominá-las, criam a figura das chamadas ‘Sociedades Anônimas Simplificadas’, cujo nome reflete justamente as simplificações trazidas pela LC. A começar pela administração das companhias, a composição da Diretoria que antes se exigia o mínimo 02 (dois) membros, agora bastará apenas 01 (um), conforme nova redação do art. 143 da Lei das S.A. A medida simplifica o sistema de controle da sociedade, permite que a empresa adeque a composição da Diretoria à sua realidade de negócio, e representa inclusive uma possível economia nos casos de redução do quadro para um único diretor ou diretora.
Seguindo nesta linha de economia, a nova redação atribuída ao art. 294 da Lei das S.A., traz três grandes benefícios para as companhias fechadas com receita bruta anual de até R$ 78.000.000,00 (setenta e oito milhões de reais): o primeiro deles permite que estas sociedades realizem as publicações obrigatórias de forma eletrônica, configurando-se como uma exceção à regra do art. 289 que determina a publicação no órgão oficial da União/Estado/Distrito Federal, conforme o lugar em que esteja situada a sede da companhia, e em outro jornal de grande circulação.
Para as sociedades beneficiadas por esta previsão a economia será latente, dispensando os gastos exorbitantes com as publicações de diversos atos nos jornais impressos. Em segundo lugar, a sociedades enquadradas no art. 294 podem agora substituir seus Livros Sociais (previstos no art. 100 da Lei das S.A.) por registros mecanizados ou eletrônicos. A adoção destes novos mecanismos de registros traz uma simplificação considerável para as escriturações de Atas de Reuniões, Assembleias, Presença dos Acionistas, Registros de ações, entre outros.
Por derradeiro, ainda o art. 294, §4º trouxe uma importantíssima flexibilização na gestão das sociedades em questão, criando uma exceção ao art. 202 da Lei das S.A. que apresenta uma série de regras básicas e obrigatórias para distribuição dos lucros, permitindo agora que tais regras sejam estabelecidas à critério da Sociedade, ou seja, caso o Estatuto não tenha uma previsão sobre os dividendos, a Assembleia Geral poderá distribuí-los livremente, desde que não seja prejudicado o direito dos acionistas preferenciais de receber os dividendos fixos ou mínimos a que tenham
prioridade.
A introdução da distribuição desproporcional dos dividendos à respectiva participação no capital social concede uma maior liberdade aos acionistas a fim de equalizar os Estatutos de suas sociedades aos propósitos e necessidades da companhia, e não apenas às regras preestabelecidas pela Legislação. Essa e as demais inovações do art. 294 serão disciplinadas pelo Ministro de Estado da Economia. Além disso, a partir da criação dos artigos 294-A e 294-B, o acesso facilitado ao Mercado de Capitais é agora uma realidade para as companhias de menor porte, ou seja, aquelas com receita bruta anual inferior a R$ 500.000.000,00 (quinhentos milhões de reais). Alguns dos critérios burocráticos e onerosos que envolvem o mercado de ações poderão ser modulados ou até mesmo dispensados para as companhias de menor porte.
Esta regulamentação ficará a cargo da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que irá dispor sobre a obrigatoriedade de instalação do conselho fiscal a pedido de acionistas e da intermediação de instituição financeira em distribuições públicas de valores mobiliários, além de tratar sobre o recebimento de dividendo obrigatório e também quanto à forma de realização das publicações
ordenadas da Lei das S.A.
Serão estabelecidos procedimentos simplificados quanto à obtenção de registro de emissor, às distribuições públicas de valores mobiliários de sua emissão e à elaboração e à prestação de informações periódicas e eventuais.
A CVM poderá, ainda, determinar a forma de atualização do valor de R$ 500.000.000,00 (quinhentos milhões de reais) previsto como teto da receita bruta anual e também os critérios adicionais para a manutenção da condição de companhia de menor porte após seu acesso ao mercado de capitais, assim como dispor a respeito do tratamento a ser empregado às companhias abertas enquadradas no critério da receita bruta.
A LC 182/2021 traz consigo alguns eixos centrais, especialmente com relação às alterações aqui abordadas da Lei das S.A.: desburocratização, economia, desoneração e maior liberdade à companhia ao compor seu estatuto e estabelecer sua gestão. Juntos estes elementos remontam uma tendência que se pode atribuir um caráter mundial na simplificação deste tipo societário, como se vê na chamada Société par Actions Simplifiée amplamente utilizada na França, modelo caracterizado pela grande flexibilidade operacional, conforme descrição do próprio Ministério da Economia Francês.
Tem-se, portanto, a partir da Lei Complementar nº 182/2021 (Marco Legal das Startups), um passo importante para a modernização das companhias brasileiras de natureza jurídica de sociedade por ações, o que possivelmente atrairá o empresariado para este tipo societário facilitado.