Na era digital, as interações humanas ocorrem de forma cada vez mais virtual, a transformar a maneira como as pessoas se comunicam, negociam e resolvem conflitos. Essa realidade traz desafios importantes para o sistema jurídico, que precisa adaptar-se à dinâmica das provas digitais, como mensagens de aplicativos e mídias compartilhadas, cuja confiabilidade muitas vezes é questionada. Em um contexto de avanços tecnológicos e digitalização das relações sociais e comerciais, a relevância da Ata Notarial como instrumento jurídico tem crescido significativamente: decisões judiciais recentes destacam a fragilidade de provas digitais, como prints de mensagens de aplicativos, e reforçam a necessidade de sua validação através de mecanismos confiáveis. A Ata Notarial, ao conferir presunção de veracidade a fatos registrados, torna-se uma ferramenta essencial para a elaboração de provas robustas.

O recente caso decidido pelo juiz Raul Márcio Siqueira Júnior, da 1ª Vara Cível de Santos/SP, é um exemplo paradigmático: a decisão judicial em questão se deu em sede de ação judicial movida por uma drogaria em face de fornecedora de sistema de gestão empresarial, em que a primeira apresentou áudios e prints de mensagens como provas dos supostos prejuízos sofridos. Contudo, essas provas foram impugnadas pela parte adversa, que alegou falta de comprovação da cadeia de custódia e ausência de certificação técnica, como perícia ou ata notarial. O magistrado acolheu a impugnação, destacando que provas digitais, devido à sua alta suscetibilidade à manipulação, demandam critérios rigorosos para comprovação de autenticidade

Tal evento, emblemático a toda prova, recobra nossa atenção acerca da imprescindível necessidade de que o relato de fatos e versões revista-se de presunção adequada, sobretudo em contextos como o judicial, em que as decisões de qualquer caráter necessitam fundar-se em elementos mínimos de verossimilhança e realidade. Nesse contexto, a atividade extrajudicial desponta como ferramenta indispensável para a validação de provas digitais, conferindo segurança jurídica e contribuindo para a efetividade da justiça. Para este propósito, a Ata Notarial assume papel central: previsto no artigo 384 do Código de Processo Civil, trata-se de um instrumento público lavrado por tabeliães que, com base na fé pública conferida a sua função, autentica eventos, declarações ou documentos, atribuindo-lhes presunção de veracidade. No caso das mensagens digitais, o procedimento consiste em verificar diretamente no dispositivo do usuário a existência e o conteúdo das conversas, transcrevê-las fielmente e registrar informações essenciais, como datas, horários e interlocutores. Além disso, a Ata pode ser acompanhada por imagens das mensagens, conferindo ainda mais solidez à prova apresentada.

O exemplo do caso Neymar, ocorrido em 2019, é emblemático no uso da Ata Notarial como ferramenta para a validação de provas digitais: o jogador foi acusado de estupro e, para se defender, apresentou mensagens trocadas via WhatsApp com a suposta vítima. Para que as conversas pudessem ser usadas no processo judicial, recorreu-se ao devido instrumento, que garantiu a integridade e a autenticidade do conteúdo, tornando as mensagens uma prova legítima perante o tribunal. Esse episódio não apenas ilustrou a importância da Ata Notarial em casos de grande repercussão, mas também estabeleceu um precedente sobre como lidar com evidências digitais em processos judiciais.

Outro exemplo significativo é o uso da Ata Notarial no combate ao bullying e cyberbullying, conforme a Lei 14.811/24, legislação esta que tipificou tais condutas como crimes, atribuindo-lhes sanções específicas. Nesses contextos, a Ata Notarial atua como elemento probatório essencial para documentar interações virtuais ou presenciais, a permitir a persecução penal efetiva e resguardando os direitos das vítimas. Ao registrar mensagens, conteúdos de redes sociais e outros elementos digitais, a Ata Notarial assegura que tais dados sejam considerados provas válidas nos processos judiciais.

A invalidação dos prints no caso da drogaria contra a fornecedora reforça a relevância desse instrumento: o magistrado, ao determinar o desentranhamento das provas, enfatizou que a ausência de certificação técnica compromete a confiabilidade das informações apresentadas. Sem a verificação de autenticidade, é impossível assegurar que o conteúdo das mensagens não tenha sido adulterado, o que fragiliza a estrutura probatória e, consequentemente, o próprio processo judicial.

A Ata Notarial, além de assegurar a integridade das provas, também contribui para a pacificação social, ao reduzir disputas sobre a validade das informações digitais: sua eficácia na resolução de litígios e sua capacidade de evitar fraudes e controvérsias fazem dela um investimento valioso. Em situações onde as provas digitais são os únicos elementos comprobatórios disponíveis, sua utilização revela-se uma medida prudente e essencial para garantia e manutenção da justiça.

Em um ambiente jurídico cada vez mais permeado por evidências digitais, é crucial que os operadores do direito compreendam e utilizem adequadamente os instrumentos disponíveis para garantir a autenticidade das provas. A Ata Notarial, nesse sentido, emerge como um dos pilares da segurança jurídica na era digital, a conectar a modernidade à tradição do direito, e a garantir que a verdade prevaleça mesmo diante dos desafios impostos pelas novas tecnologias.

O caso discutido e outros exemplos célebres como o do jogador Neymar ilustram que, para o sistema jurídico brasileiro, a Ata Notarial não é apenas uma formalidade, mas sim um recurso indispensável para a proteção da justiça e da equidade nos processos judiciais. Ela assegura que, mesmo no ambiente volátil das interações digitais, a verdade dos fatos pode ser preservada e apresentada de forma robusta, a consolidar seu papel como guardiã da integridade das provas em nosso ordenamento jurídico.

 

Por Ana Luísa Oliveira de Faria