STJ: a reinclusão do sobrenome paterno ao nome da mulher
Em recentíssimo julgamento de sede de Recurso Especial o Superior Tribunal de Justiça entendeu ser possível, de modo excepcional, a reinclusão do sobrenome paterno ao nome de mulher que o retirou para a inclusão do sobrenome do marido quando do casamento.
Segundo noticiado pelo próprio STJ[1], a argumentação utilizada pela autora no Recurso Especial foi que, após a inclusão do nome de seu marido em razão do casamento e a retirada do sobrenome paterno, seu nome completo tornou-se bastante comum no Brasil e, consequentemente, haveria muitos homônimos. Utilizou ainda como argumento a seu favor o fato de que seus filhos adotaram o sobrenome do seu avô materno.
O Recurso foi interposto ao STJ após o indeferimento do pedido pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, sob o fundamento de que o sobrenome paterno indica o tronco familiar e considerando-se o Sistema Registral Brasileiro, em especial a Lei nº 6.015/73 – Lei de Registros Públicos –, embora o prenome é possível de ser mudado, o nome de família não, em atenção ao quanto disposto no artigo 56 da referida Lei[2].
O Ministro Luís Felipe Salomão deu provimento ao pleito permitindo a inclusão do sobrenome paterno após o sobrenome de seu marido. A questão toda foi decidida com base na necessária prevalência dos direitos da personalidade e da dignidade humana, bem como a preservação da integridade e da unidade familiar. Para o Ministro, na legislação brasileira, diferentemente do quanto decidido pelo TJRS, não há qualquer impedimento à reinclusão de sobrenome paterno após o sobrenome adquirido com o casamento, havendo, inclusive, precedentes da corte que permitiram tal retificação, seja com o acréscimo do sobrenome paterno ou materno ao nome da mulher.
Vale ressaltar que sobre o caso, o Diretor Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), professor Zeno Veloso, manifestou-se de modo concordante ao entendimento do Ministro, pois não havendo qualquer interesse criminoso ou falcatrua na reinclusão, para ele, não haveria qualquer motivo para indeferir o pleito[3].
A nosso ver, o provimento ao Recurso Especial constituiu louvável entendimento, ao defender a preservação dos direitos da personalidade da mulher, especialmente porque não se verificou qualquer prejuízo à plena ancestralidade ou à sociedade.
 
*Fernanda Lopes Martins, advogada, formada em Direito pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo (USP), com conclusão em dezembro de 2018 e mestranda em Direito Antitruste pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo (USP) com conclusão prevista para agosto de 2021.
 
[1] http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/Mulher-podera-reincluir-sobrenome-paterno-que-foi-retirado-no-casamento.aspx.
[2] Art. 56. O interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa.
[3]http://www.ibdfam.org.br/noticias/7255/Sobrenome+paterno+pode+ser+reinclu%C3%ADdo+ap%C3%B3s+ser+retirado+na+ocasi%C3%A3o+do+casamento%2C+decide+STJ.
__________________________________________________________________________________________________________________
O artigo 4º do substitutivo SF ao PL nº 675/2020 e sua inconstitucionalidade
De autoria dos Deputados Denis Bezerra – PSB/CE e Vilson da Fetaemg – PSB/MG, o Projeto de Lei nº 675 de 2020, apresentado no dia 17 de março de 2020, tratava, dentre outros, da proibição de inscrições nos cadastros de empresas de análises e informações para decisões de crédito enquanto vigente a calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19.
Perante votação em Plenário, o Deputado Julian Lemos – PSL/PB foi designado como relator e ficou encarregado de apresentar parecer pelas Comissões de Defesa do Consumidor; Finanças e Tributação e Constituição e Justiça e de Cidadania, concluindo pela aprovação da matéria, na forma do Substitutivo.
O substitutivo trouxe modificações sutis ao texto, tais como a modificação da validade da medida para diminuir sua aplicação a um prazo de 90 dias, prorrogáveis por ato da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), do Ministério da Justiça; e o aperfeiçoamento da competência de fiscalização (art. 2º) deixando mais genérica a disposição e permitindo a aplicação de sanções previstas no Código de Defesa do consumidor.
Aprovado no dia 09 de abril, o Projeto de Lei seguiu ao Senado Federal para revisão, nos termos do sistema bicameral brasileiro, sendo que no dia 11 de maio a matéria recebeu 03 emendas em Plenário, e no dia 12 de maio foram apresentadas mais 17 emendas de diversos parlamentares tratando sobre pontos distintos da matéria. Ainda, na mesma sessão, foi designada a Senadora Rose de Freitas – PODEMOS/ES como relatora da matéria.
Na Sessão Plenária do dia 12 de maio de 2020, o Projeto de Lei nº 675 de 2020 restou aprovado na forma de substitutivo, trazendo em seu texto, através do artigo 4º, a novel, mas funesta, previsão de suspensão da atividade notarial de protesto de títulos e documentos de dívida, retornando, frente às inovações, para nova apreciação da Câmara dos Deputados.
Fato é que o artigo 4º do Substitutivo SF ao PL nº 675/2020 possui constitucionalidade e legalidade notadamente questionáveis, de uma porque, ao suspender a atividade notarial de protesto, adentra em matéria afeta a organização de serventias extrajudiciais, logo, reservada ao Poder Judiciário, violando frontalmente as alíneas “b” e “d” do inciso II do art. 96 da Constituição da República e a jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal; de outra porque traz ilegais prejuízos à prestação dos serviços notariais e de registro de modo eficiente e adequado (art. 4º da Lei n. 8.935/94), afrontando o princípio da continuidade dos serviços públicos.
Conforme se infere, a redação do artigo 4º em testilha traz previsão legislativa a respeito da organização dos Tabelionatos de Protestos, serventia extrajudicial, no momento em que suspende o normal funcionamento dos tabelionatos ao proibir a execução dos atos de protestos de títulos e outros documentos de dívidas, regulados pela Lei de Protestos, de modo que é pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que as leis que disponham sobre a organização das serventias judiciais e extrajudiciais são de iniciativa privativa do Poder Judiciário, a teor do que dispõem as alíneas “b” e “d” do inciso II do art. 96 da Constituição da República, conforme já restou decidido na ADI nº 1.935/RO, sob a relatoria do Ministro Carlos Velloso, DJ de 4/10/02; na ADI nº 865/MA-MC, sob a relatoria do Ministro Celso de Mello, DJ de 8/4/94, na ADI 3773, sob a relatoria do Ministro Menezes Direito e, recentemente, na ADI nº 4.223, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes.
No exercício de sua competência privativa, a Corregedoria Nacional de Justiça, órgão do Poder Judiciário que tem competência de expedir provimentos, recomendações e outros atos normativos destinados ao aperfeiçoamento das atividades dos serviços notariais e de registro (art. 8º, X, do Regimento Interno do CNJ), demandando diretrizes a serem obrigatoriamente observadas pelos notários e registradores, uniformizou, em âmbito nacional, o funcionamento das serventias extrajudiciais durante o período de "coronavírus".
Neste particular, os provimentos recentemente editados pelo CNJ (Provimentos n.º 91, 95, 97 e 98, todos de 2020) consideraram os serviços notariais e de registro, dentre eles o protesto, como essenciais para o exercício da cidadania, para a circulação de propriedade, para a obtenção de crédito com garantia real, para a prova do inadimplemento de títulos e outros documentos de dívida com a chancela da fé pública.
A essencialidade afirmada e reafirmada pelo Poder Judiciário em suas decisões e em seus atos normativos, lembre-se, proferidos durante o período de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional em que estamos passando, tomam por base que a manutenção dos serviços de protesto corrobora a intenção pública de previsibilidade das relações obrigacionais, diminuindo os riscos de crédito e, por conseguinte, aumentando a tendência de interações econômicas na sociedade.
A redação do artigo 4º do Substitutivo SF ao PL nº 675/2020 ignora totalmente que o protesto de título se mostra como ferramenta necessária para a boa dinâmica social, de modo que a suspensão dos protestos, na forma sugerida pelo dispositivo, imporá indevido represamento de demandas e acentuará conflitos de crédito, os quais, por certo, culminarão em inúmeras ações judiciais futuras, tumultuando também as atividades jurisdicionais por meio do aumento da judicialização de demandas, sobrecarregando ainda mais o Poder Judiciário e indo em sentido totalmente contrário aos movimentos de desjudicialização e desburocratização que o Poder Legislativo tanto defende e se pauta.
 
* Tiago de Lima Almeida, advogado sócio do escritório Celso Cordeiro e Marco Aurélio de Carvalho Advogados, Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC/MG, Pós-Graduado em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários IBET, MBA em Gestão Tributária pela Fundace – FEA/USP, Mestre em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP; Doutorando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP. Vice Presidente da Comissão Especial de Direito Notarial e de Registros Públicos da OAB/SP.
__________________________________________________________________________________________________________________
Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo edita o provimento CG Nº 12/2020 que regulamenta os registros notarias por meio eletrônico
Visando reduzir os impactos trazidos pela Pandemia da Covid-19 e facilitar os registros notariais durante esse período, a Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Paulo publicou dia 28 de abril de 2020 o Provimento CG nº 12/2020 que regulamenta a pratica de atos notariais à distância.
O provimento permite que os Tabelionatos de Notas de todo o Estado de São Paulo possam lavrar escrituras públicas e atas notariais por meio eletrônico, assim como verificar a capacidade das partes e formalizar suas vontades através de videoconferência ou outro meio de eletrônico seguro.
De acordo com o Provimento, a videoconferência será conduzida pelo tabelião de notas, que deverá indicar a abertura da gravação, a data e hora de seu início, o nome por inteiro dos interessados, bem como realizar, ao término do ato, a leitura na íntegra de seu conteúdo e colher a manifestação de vontade de seus participantes com a posterior assinatura digital de todos os envolvidos no ato por meio de certificado digital, sendo vedada sua alteração em momento posterior.
A videoconferência para a coleta da manifestação de vontade poderá ser realizada em qualquer dia e horário, de acordo com a disponibilidade do tabelião de notas ou de seus prepostos, devendo ser consignada tal circunstância no corpo do ato notarial.
Além disso, o Provimento também possibilitou que o ato seja realizado com a presença de todas as partes ou individualmente, podendo a videoconferência ser suspensa caso haja a necessidade de esclarecimentos complementares, sem prejuízo da sua repetição em momento posterior.
Importante ressaltar que nem todos os atos notarias estão autorizados a serem procedidos nesses moldes, sendo expressamente vedado pelo Provimento a lavratura de escritura pública de testamento, bem como a aprovação do testamento cerrado, ficando sob responsabilidade pessoal do notário todos os atos lavrados por meio eletrônico.
As disposições previstas no Provimento possuem validade por 30 dias contados do dia de sua publicação.
*Mariana Vechi Saab, advogada, formada em Direito pela Universidade de Ribeirão Preto, campus Ribeirão Preto, Estado de São Paulo, com conclusão em dezembro de 2019.